Tudo o que você precisa saber sobre a Lei 14.300

O que é a Lei 14.300?

A Lei 14300/22 publicada em 07/01/2022, alterou a maneira como o mercado era  regulamentado até então pela REN 482/2012. Com isso, essa norma instituiu o marco legal da microgeração e minigeração distribuída, o Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE) e o Programa de Energia Renovável Social (PERS), com a importância de proporcionar segurança jurídica ao setor solar e garantir o direito do consumidor de gerar a própria energia.

Principais mudanças trazidas pela Lei 14300

Dentre as mudanças ocasionadas com a nova lei, houve a redução do limite de potência de minigeração de 5 MW para 3 MW para fontes não despacháveis, como é o caso da fonte solar fotovoltaica, como definido pelo Art. 1° XIII. Além disso, foi estabelecida a garantia de fiel cumprimento para as centrais geradoras com potência instalada superior a 500kW, pelo Art. 4º e a aplicação de demanda TUSDg para unidades geradoras (Art. 18).

Também, para consumidores com usinas de até 112,5 kW, com geração local, têm direito de optar pelo faturamento em baixa tensão ( B optante), como é incluído no Art. 11. §1°. Outra possibilidade instaurada foi a de alocar créditos através de uma nova ordem de prioridades como unidades consumidoras e não somente através dos percentuais fixos ( Art.14). Essas mudanças são aplicadas para todos os usuários.

Ademais, a mudança que tem repercutido maior receio entre os consumidores foi a adição da cobrança de componentes tarifários, principalmente do Fio B, para os consumidores que possuem geração própria. No entanto, essa cobrança não se aplica de imediato a todos os sistemas geradores, visto que alguns deles possuem o que é conhecido como “direito adquirido”.

O que é o “direito adquirido” e quem é detentor deste?

O direito adquirido mantém as regras da compensação total da energia até 2045 para os consumidores já conectados, ou seja, compensa todos os componentes tarifários sem aumento de remuneração da concessionária com parcelas do Fio B, visto que esta remuneração é feita a partir do custo de disponibilidade e da demanda contratada. No entanto, em estados que possuem a cobrança de ICMS sobre a TUSD não é possível que a isenção seja em relação ao valor total da tarifa.

A esse respeito, são detentores desse direito, apenas as usinas que solicitaram acesso ou já existentes antes do dia 07/01/2023 ( um ano após a promulgação da norma). Com isso, a Lei 14300 dispõe ainda que o direito adquirido só estará garantido àquelas unidades consumidoras que, a partir da emissão do Orçamento de Conexão, conectarem a usina à rede e começarem a gerar e injetar energia nos prazos de 120 dias para microgeração;  12 meses para minigeração de fonte solar e 30 meses para minigeradores de outras fontes.

Em quais casos pode ocorrer a  perda do direito adquirido?

O direito adquirido pode ser invalidado a partir do encerramento contratual da unidade consumidora. Contudo, em caso de troca de titularidade do imóvel não se tem a perda desse direito, sendo transferido ao novo titular. Dessa forma, em caso de desinstalar ou transferir o sistema para outro local físico se perde o direito adquirido. Neste caso será necessário refazer o projeto, dando entrada novamente na Solicitação de Orçamento de Conexão para uma nova unidade consumidora.

Isso ocorre também em casos de identificação de irregularidades no sistema por parte do consumidor, ou seja, quando sistemas são instalados ou alterados de maneira  clandestina, sem aprovação pela distribuidora.

Já para ampliação de sistema após o dia 07/01/2023, apenas a parcela adicionada ao sistema após a data deverá seguir as novas regras de pagamento.

 

[Greener - Videoaula: Lei 14300 geração distribuída e atratividade com as novas regras]

A imagem acima, divulgada pela Greener, demonstra a linha do tempo em que acontecerão as alterações, desde a promulgação da Lei, até o fim do direito adquirido em 2045 quando serão aplicadas novas regras.

Qual o impacto da Nova Lei para cada consumidor?

De maneira resumida, a ANEEL separou em três os grupos impactados pela nova lei:

  1. GD I: art. 26 da Lei n. 14.300/2022. Conexões existentes ou solicitadas até 7 de janeiro de 2023;
  2. GD II: caput do art. 27 da Lei n. 14.300/2022. Conexões solicitadas a partir de 8 de janeiro de 2023, que não se enquadram nas condições da GD III;
  3. GD III: § 1º do art. 27 da Lei n. 14.300/2022. Conexões solicitadas a partir de 8 de janeiro de 2023, com potência instalada acima de 500 kW, em fonte não despachável na modalidade autoconsumo remoto ou na modalidade geração compartilhada, em que um único titular detenha 25% ou mais de participação do excedente de energia.

É válido lembrar que algumas mudanças promulgadas pela lei são válidas a todos os grupos, incluindo aqueles que possuem direito adquirido. Entretanto, para o recolhimento do Fio B, o grupo GDI é isento, visto que representa as unidades geradoras detentoras deste benefício.

O grupo GDII representa os consumidores que não possuem direito adquirido, mas sofrem cobranças mais brandas e progressivas em relação ao Fio B, visto que possuem perfil diferente do agrupamento GDIII que sofre alterações mais severas.

A classe GDIII enquadra as usinas com potência instalada acima de 500 kW, em fonte não despachável na modalidade autoconsumo remoto ou na modalidade geração compartilhada, em que um único titular detenha 25% ou mais de participação do excedente de energia. Os consumidores que se encaixam nessa classificação, terão cobranças a mais que os demais grupos como veremos no decorrer deste artigo.

O que é o Fio B e como será feita sua compensação após a Lei para os que não possuem o direito adquirido?

O fio B é o valor cobrado dentro da composição tarifária para que a energia seja distribuída na rede. Correlato a isso, a cobrança do Fio B é uma maneira que as concessionárias encontraram  de serem remuneradas pelo transporte da energia que é injetada e levada até uma outra unidade consumidora. Até então, a unidade geradora pagava à concessionária a demanda ou custo de disponibilidade do transporte desta energia.

A figura acima demonstra como é feita, em média, a segregação da tarifa de energia, representando em porcentagem a parcela de cada componente. A partir de então,  com a Lei 14300 o consumidor que recebe injeção será tarifado com a parcela de cada componente de maneira correspondente ao grupo em que ele está alocado.

TARIFAÇÃO DO FIO B

A partir do aumento na taxação do Fio B, é correto dizer que a energia gerada por meio da usina fotovoltaica terá valor inferior em relação ao valor do kWh fornecido através da concessionária. No entanto, para menor impacto, a cobrança do fio B será feita gradualmente, conforme o cronograma previsto pelo marco legal, a seguir:

Para autoconsumo local, geração compartilhada, desde que um único consumidor não receba 25% ou mais de créditos, autoconsumo remoto até 500 kW e fontes despacháveis (GD II):

  • 2023 – 15%
  • 2024 – 30%
  • 2025 – 45%
  • 2026 – 60%
  • 2027 – 75%
  • 2028 – 90%
  • 2029 – haverá novas regras, as quais serão abordadas em um próximo artigo.

Para autoconsumo remoto maior que 500 kW e geração compartilhada quando o consumidor tiver 25% ou mais dos créditos (GD III):

  • 100% fio B + 40% fio A + TFSEE +P&D( 100% (cem por cento) dos encargos Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e Eficiência Energética (EE) e Taxa de Fiscalização de Serviços de Energia Elétrica (TFSEE).

Dessa forma, os consumidores que fizeram a solicitação de acesso após a data em que foi instaurada a norma, e se enquadram como Geração junto à Carga, Geração Compartilhada, EMUC ou Autoconsumo Remoto limitado a 500kW de potencia instalada (GD II) entraram na  regra de transição em que, aplica-se a nova regra para faturamento de demanda contratada de usinas remotas, havendo o pagamento da TUSD injeção; e  aplica-se também atualização da regra do custo de disponibilidade.

Atualização da regra para cálculo do valor mínimo faturável de energia

Foram feitas alterações no cálculo do valor mínimo faturável, sendo posto no Art. 16 o incremento para o cálculo. Esse artigo discorre que em um sistema de uma unidade geradora ou recebedora de energia, a compensação será até o valor mínimo faturável, ou seja, o máximo que será compensado naquela fatura é o consumo total subtraído pelo custo de disponibilidade. Siga os exemplos abaixo:

Exemplo 01:

Unidade consumidora com ligação bifásica: custo de disponibilidade equivalente a 50 kWh

Consumo medido pela concessionária: 550 kWh

Injeção de energia medida pela concessionária: 700 kWh

Valor da tarifa: R$ 1,00 

GDI

Paga-se custo de disponibilidade: 50 kWh x R$1,00 = R$ 50,00

Abate o consumo de 500 kWh e gera um saldo ou excedente de 200 kWh

GDII

em 2023, paga-se o valor de 15% do fio B
Supondo que na concessionária do exemplo o fio B equivale a 30% do total da tarifa
15% x 30% = 4,5% 

4,5% de R$1,00 equivale a cobrança de R$0,045 por kWh compensado, então o exemplo ficaria da seguinte forma:

Saldo ou excedente = 700 – 550 = 150 kWh

Fio B sobre consumo: 550 kWh x R$0,045 = R$24,75 

Como R$24,75 é em reais, menor que o custo de disponibilidade, nesse caso o valor mínimo faturável será o custo de disponibilidade no valor de R$50,00.

Exemplo 02:

Unidade consumidora com ligação trifásica: custo de disponibilidade equivalente a 100 kWh

Consumo medido pela concessionária: 3.500 kWh

Injeção de energia medida pela concessionária: 4.000 kWh

Valor da tarifa: R$ 1,00 

GDI

Paga-se custo de disponibilidade: 100 kWh x R$1,00 = R$ 100,00

Abate o consumo de 3.400 kWh e gera um saldo ou excedente de 600 kWh

GDII

em 2023, paga-se o valor de 15% do fio B
Supondo que na concessionária do exemplo o fio B equivale a 30% do total da tarifa
15% x 30% = 4,5% 

4,5% de R$1,00 equivale a cobrança de R$0,045 por kWh compensado, então o exemplo ficaria da seguinte forma

Saldo ou excedente = 4.000-3.500 = 500 kWh

Fio B sobre consumo: 3.500 kWh x R$0,045 = R$157,50

Como R$157,50 é em reais, maior que o custo de disponibilidade, nesse caso o valor mínimo faturável será a parcela do fio B  no valor de R$157,50.

OBS: Nos exemplos acima não foram consideradas outras cobranças da fatura como iluminação pública, multa por fatura atrasada, doações, etc..

REN 1059 da ANEEL 

A REN 1059 foi criada e publicada em 07/02/2023 para regulamentar tecnicamente a Lei 14.300, revogando a REN 428/2012 que foi a primeira regulação para o mercado solar, criando o sistema de compensação, e também a REN 687/2015 que trouxe algumas melhorias e novos modelos de compensação.

De acordo com essa nova determinação, haverá o pagamento da TUSD G, ou seja, será necessário contratar uma demanda de geração, pelo uso da rede para aqueles que a usam para injetar energia , inclusive para o grupo tarifário B. Usinas de média tensão, em que há apenas geração, sem consumo local, poderão optar pela contratação somente da TUSD G, sem a necessidade de contratar a demanda de carga, diminuindo o valor mínimo fixo da fatura.

Da mesma forma, será cobrado no mínimo o custo disponibilidade, sendo assim, se o valor do consumo mínimo em reais for menor que o custo disponibilidade, será cobrado apenas o mínimo deste. No entanto, se o montante do consumo mínimo for maior que o valor em reais do custo de disponibilidade, será recolhido somente a parcela referente ao Fio B. Com isso, não haverá o que chamamos de “cobrança em duplicidade

Além disso, a partir de então, consumidores classificados como B optante, não podem receber nem enviar créditos, podendo ser apenas autoconsumo local. Isso ocorre, pois esse tipo de usuário, apesar de ser atendido em média tensão, pode optar por ser cobrado pela energia que ele consome como um consumidor de baixa tensão por se enquadrar em alguns parâmetros da REN 1000, de dezembro de 2021. Com isso, foi instituído que os usuários que optarem pela cobrança dessa maneira, pagando um valor menor mínimo à concessionária, equivalente a baixa tensão, não teriam direito a ser uma unidade geradora que injetasse energia em rede para unidades consumidoras a longa distância.

Benefícios da Lei 14300 para o mercado

Além de proporcionar segurança jurídica ao setor de geração distribuída e garantir o direito do consumidor de gerar sua própria energia, a nova lei trouxe consigo demais benefícios ao setor e seus consumidores. 

Para exemplificar, podemos dizer que houve uma desburocratização no processo de conexão à rede elétrica, visto que a partir de então esse processo será mais simplificado, facilitando o trabalho dos integradores na instalação e diminuindo o tempo de espera pelo consumidor para começar a obter o benefício. Atrelado a isso, houve a diminuição no prazo para recebimento dos créditos, que agora ocorrem de 30 a 60 dias.

Outro benefício  é que, com a Lei 14.300, há a possibilidade de adiar o prazo de conclusão de obra e, consequentemente, o início do pagamento da demanda contratada. Para isso, o usuário deve comprovar à concessionária que a obra ainda está em processo.

Mais um ponto vantajoso é a determinação que as bandeiras tarifárias não afetarão a energia excedente que é injetada em outra unidade consumidora. Logo, o consumidor que tem geração de energia própria pagará bandeiras tarifárias apenas sobre o que for consumido da distribuidora. É possível também que a partir de então, unidades micro e minigeradores tenham o enquadramento de optante BT, quando a geração junto a carga e o inversor sejam de até 112,5 Kva.

Conclusão: Mesmo com as mudanças implicadas pela Lei 14300, ainda vale a pena investir em energia solar em 2023?

[Sistema Solar Fotovoltaico instalado pela Sharenergy na Fábrica da Prima Línea]

É válido lembrar que a Lei 14300 traz consigo a arrecadação de um serviço prestado já utilizado pelos consumidores que passou a ser cobrada neste ano. No entanto, em nada se compara com o custo da energia elétrica e seus aumentos sucessivos.

A energia solar fotovoltaica segue, mesmo com a nova regulamentação, sendo um investimento econômico de vida útil duradoura, de fonte renovável e sustentável, que pode ainda em 2023 gerar até 80% de economia para os geradores de energia a partir da energia solar, de acordo com o jornal  Diário do Nordeste. Logo,  os investidores podem esperar retornos financeiros cada vez maiores ao investir em sistemas de energia solar.

Além disso, a demanda por energia limpa está crescendo conforme os países estabelecem metas para redução de emissões para frear os efeitos do aquecimento global. Com isso, países e instituições financeiras estão investindo e incentivando a energia solar, que tende a se popularizar ainda mais, gerando uma redução de custos no setor. A expectativa é de que a tecnologia se torne ainda mais acessível economicamente e atrativa aos consumidores no longo prazo.

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